domingo, 23 de dezembro de 2012

Final dos tempos

Que verdade há
Afinal
Na linha final
Do final do ano?
Se em janeiro continua
O verão
Derramando águas
Lavando as almas
Da fuligem do tempo!
Se começo
Nada mais acontece
Do que outros começos
Que acontece
A qualquer tempo!


As luzes desencantadas

Um faiscar desdenhoso
lâmpadas natalinas
derramando um leite
caudaloso
que sem gosto
deixou de agradar.

Ano Novo bom


Ao passar este ano
Ano Novo é desejável
como que o novo fosse acontecer
pudera que fosse verdade.

Esta febre que me acomete
que a minha pele não revela
mas presente nas entranhas
desconhece
que o Ano Novo acontece.

Que sinal revela
esta água que baixa
pelos canos do nariz?

Esta água que lá fora
inundou o jardim
prenuncia janeiro
transbordando pelas ruas
a invadir bueiros
e a desalojar os ratos.

O que parece novo
não se trata de uma esperança
uma esperança envelhecida
mas uma  ilusão
que se renova.

Os poetas mortos

Estes amigos poetas
morreram todos
sem companhia para
poetar
minha companhia
com quem não converso
espera alguém
que pare de vez
de poetar.

Enquanto alguns esperam

As noites alongadas
pelas mesas dos bares
ficam cheias às sextas-feiras
ficam de bebedeira
os desiludidos
enquanto os iludidos
esperam o amanhã chegar.

Como que amanhã pudesse existir!

Queima a mata

Os bicos de fogo
continuamente acesos
em toda Mata Atlântica
queima metais pesados.

E a fumaça branca
num rastro ascendente
confunde-se com as nuvens
que começa a arder numa
chama sulfúrica
a queimar a ponta das folhas.

E a fumaça negra
num tropel de cavalos selvagens
 a pisotear corpos
que perderam a natureza humana.

O túnel

Estes túneis que cortam
a serra
é uma viagem
nas próprias entranhas
silencioso e mudo.

O mar

Quero ver o mar
e desesperadamente mergulhar
meu corpo insalubre
e lavar a alma.
Pudesse lavar
por um instante que fosse
meus karmas
de um passado inglório
em que bebi de licores
coloridos da ilusão!

Tempestade

Em cavalos negros
as nuvens de dezembro
cavalgam tempestades.

O que cavalgo neste momento
senão o dorso em febre
de meu próprio pensamento
que divagante conhece
o vento cortante
e a dureza das pedras.

Assim caminhava

Um andor do Senhor
dos Milagres caminhava
nos ombros de homens
que carregavam pesado
num andor carregado
de fé
de calor.

Homens que carregavam
o andor do Senhor
enquanto mulheres lamentavam
deixando um rastro de incenso
no ar carregado de sofrimento.

Homens que carregavam
todos os pecados do mundo.
Homens que pediam
um milagre
um andor do Senhor
dos Milagres caminhava.

De um bar do Peru

Este vozerio que espalha
pelas mesas do bar
tem o cheiro das sardinhas
que senti pela primeira vez
dos barcos a descarregar
suas redes carregadas
que vinham do mar.

Estas vozes que ouço
vem de um bar
vem de um cargueiro
dos pescadores solitários
que deixaram mulheres em terra
amores nas montanhas
nas planícies imensas
de areia e sal
que salgou todo o Peru.

Este sal que sopra
vem do mar.
Este vozerio vem
das mesas de um bar.

Os cristais partindo

Estes copos de champagne
transparentes
enfileirados
brilham uma brancura
de cal.

São tão irreais
derretendo ao calor da noite
em movimentos glaciais
corpos de uma mulher
prestes a partir um trincado
que se foi alongando.

Quando o tempo passa

Esta sensação de acabamento
do ano passado que passou
deixou pelos cantos
um rastro de poeira
que não se levanta
nem por encantamento.

Sem tempo para tristeza
que tomou rumo inesperado
foi-se de vez
para as águas profundas
lá no fundo do esquecimento.

Pudera em silêncio
descansar a cabeça aflita
docemente pairar nas velas
perdidas em alto mar.

Pode-se no mar
e embarcar nos redemoinhos
e girar a terra
e girar o sal
e tornar-se lama a ser moldada
de novo!

Como não dizer tudo

Ainda as palavras
em suas insubstancialidades
que como sombra varre
este chão que esconde
todos os sofrimentos
e alegrias
de uma poeira
que se assenta
e de novo se levanta
desenhando formas
de existência efêmera.

Minha vida passageira
poeira do tempo
poeira além das palavras.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Visita do tempo

Uma sensação gelada

Penetra pela imensa sala

De alguém conhecido

Desconhecido pelo tempo

Que se perdeu completamente

Por estas vias tortuosas

E clandestinas

Das ruas do centro.



Como um fantasma

De face inexpressiva

Sua voz vacilante

Remete a outras imagens

Que caíram no esquecimento.

Mas um dia

Novamente

Uma provocação insana

Salta da mente

Salta de um lugar

Que deixou de existir.



Esta poeira do tempo

Que penetra fundo

Nos olhos

Ainda incomoda

E todo esquecimento

Não passa de um desejo.