domingo, 18 de novembro de 2012

Lembranças em ruínas

Após a passagem da tempestade

Nada mais resta no chão

Daquilo que foi um dia

E caíram os castelos

E caíram as igrejas

E das ruínas

Nem sobrou a consolação

Como nada mais

Pudesse existir

Como pudesse ter existido

Um dia.



Apagou-se de um dia

Para outro

Carregado pelas águas

De uma consciência indômita

Arrasadora

Que nem mesmo restou

Uma arqueologia possível

Que pudesse compor

Um labirinto de formas

Poeiras de um passado

Que já passou

Escorrendo no ralo.





sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Clarão nas areias

Por quanto tempo silenciaram-se

Os canhões e a tempestade de areia

Nos campos de guerra

Das areias sagradas

Que em tempos passados

Foram pisadas pelas sandálias

De Moisés por quarenta anos?



Ainda não se cansaram

Incendiar a noite metálica

Das flechas flamejantes

Explodindo num espetáculo

Pirotécnico

Sem as bandeirinhas

De São João

Pois hoje não é de festa

E há muito quebrou

O cachimbo de barro

Assim a fumaça que sobe

Não é a da paz

A fumaça é a da fuligem

Dos mísseis caindo

Numa chuva ininterrupta

De intolerância.



quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Procissão

Aqueles homens carregavam

Nos ombros carregavam

Um andor com o Señor de los Milagros

Em pingas o suor corria

Dos rostos morenos

Vestidos com capas lilases

Um passo à esquerda

Dezoito homens carregavam

Todo o sofrimento do homem pobre

Dos distritos peruanos

Um passo à direita

E arrastavam de um lado

De um lado para outro

Avançavam a passos lentos

Para não chegar a lugar algum

Enquanto na cruz agonizava

Com feridas barrocas

A última esperança

Tão acalentada por todos

Das mulheres que se arrastavam

De costas

Incensando o ar parado

Dos antigos ditadores

Tão adorados.

Tão adorados.