terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Rede que balança


Escurece em instantes
dias de tempo instável
em que da parede
da vizinha de cima
uma rede é balançada
produzindo ruídos
do ferro esfregado.

Neste momento
nada mais existe
do que o som
monótono como chuva
penetrando na pele
e a esfregar junto.

Sou a rede que
balança.

Vizinhos da frente


Entre sussurros
os espelhos do elevador
não escondem os rostos
e a voz que ouço
infantil
diz
quem é este japonês?

Incômodo do outro


Ninguém se importa
com a presença
do mendigo
nem se trata
de um problema.

O problema
se trata
do mendigo que se
importa
com a indiferença
de todos.

O problema
é sempre do mendigo.

Os falsos pudores


Não são loiros
a loira tingida
mas que importa
se a vida não passa
de dissimulação.

Sem apegos


Livre para caminhar
onde as calçadas conduzem
seja nos becos
desses becos imundos
em que cães vadios
fizeram morada
seja nas avenidas
amplas de asfalto rosa
não importa onde seja.

Livre para sentir o
aroma dessas árvores
sem nome
as axilas das morenas
banhadas com água
de cheiro.

Livre para morrer
quando a morte chegar
num beijo frio
de despedida.

As paredes falam


Que procuro afinal
pelas paredes da zona norte
pudera fosse encontrar
um registro perdido
mas
sem nenhuma importância.

Se importante fosse
importante seria esta vida
vivida intensamente
em cada esquina.

Se (des)importante fosse
saborear então a brisa
que ligeira passa
entre os fios de barba
em semiconsciência.

À frente perdedores


Alguns são perdedores
por perderem
nada mais tem por
perder.

Nem perdem a vida
nem a morte
nem a noite
nem o dia.




Os passageiros de taxi


As quaresmeiras tingem
por instantes
os olhos no fundo
em que a cidade
inteira inicia janeiro.

A brancura dos carros
são taxis
conduzindo passageiros
que conduzem desejos
alguns esquecidos
outros nem tanto.

Os loucos perambulam
com suas mortalhas
a cobrir corpos chicoteados
pelo vento
ventania de paus
da segurança que guarda
segredos da casa em que vende
vinhos raros.

Pela contramão
uma ambulância avança.

Pela contramão
a vida passa ligeira
até que chega
passamento
passageiro do tempo
cansado de caminhar
seus pés machucados.

Pela contramão!

Sem muito mais


Um homem passou
levando uma marmitinha
tudo que tinha
cabia no fundo
no fundo da marmitinha.

Nada mais tinha
tinha o mundo inteiro
o céu e os mares
a amor das mulheres
das feias e  lindas
solteiras e casadas.


-         Que mais queria ter
se tinha
tudo
numa marmitinha.

Os descaminhos da cidade


Naquela praça em que multidões
se formam
não se formou hoje.

Os uniformes cinzas da
polícia reúnem-se
no silêncio do dia
enquanto a cidade rumina
o gosto amargo do fumo.

Enquanto um sorriso
de pedra
da estátua do lado
traz encantamento
nos olhos de peixe
que se esparramam
pelas correntezas dessas
ruas que levam
a lugar algum.

Cidade que me consome
que mata a fome
no êxtase da cafeina
ainda borbulhante.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Levando a tiracolo

Por onde andará
A dona desse silêncio
Como que isso importasse
Que pudesse incomodar
Ou mudar alguma coisa.

Sem importância alguma
Ainda resta alguma lembrança
Que haverá de desaparecer
Um dia?

Mas o que poderá ser de mim
Se não tiver lembrança alguma?
Uma única lembrança
Carregada numa vareta
Levada aos ombros
Em derradeira viagem.

Ainda que esta lembrança
Seja um imenso vazio
Que fala todas as vozes.

Salve São Paulo

Pelas ruas sujas do centro
Ainda uma nostálgica visão
Toca incessante
Os olhos acostumados
Ao cimento armado
Dos edifícios que desmaiam
Sobre os viadutos serpenteando
Os sentimentos dos usuários
De ônibus que atrasam
Em tempos de chuva.

Maldita cidade
Que vai minando os poros
De um suor infestado
De gases carbônicos
De ácidos exalados
Dos canos desses motores
Que levam e trazem
Diariamente.

Bendita cidade
Que transforma o sofrimento
Em combustível
Que queima nos corações
Carburadores
Que criam energia
Elétrica
Atômica
Numa luta apaixonada
Em realizar a vida
Conquistada a duras penas.

Amada sobretudo
Pois odiada seria
Destruída por ela.
Amada simplesmente
Pois viver é necessário
Amada para ser amada
Também por ela.
Cidade madrasta
Cidade da mulher do lado
Em que os santos dormem
Ao lado das libertinas.
Benditas sejam
As pecadoras
De almas puras
Que nunca pensaram
Em ir para o céu.



domingo, 13 de janeiro de 2013

Ruas de minha vida

Nestas ruas em que andava
Nem restaram as paredes
Em que rabisquei poemas
Num momento de tristeza.
Foi-se a tinta impregnada
De uma nata
Transbordante de emoções
De um passado
Destruído em instantes.
Ruas que deixaram de existir
Ruas que fizeram parte de
Minha vida
Enterrado nos escombros
Numa explosão de dinamite.